segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Crise de Perfeição

Imagine-se na seguinte situação:
* vida familiar tranquila, e em paz, na medida do possível que uma familia pode ter;
* vida profissional caminhando de acordo com o previsto, em que você faz o que gosta, com as pessoas que admira;
* vida pessoal indo bem, com alguns bons amigos ao lado para o que der e vier, colegas para badalar, e oportunidade de conhecer sempre pessoas novas, interessantes.
*vida amorosa em stand-by, é verdade, mas sempre com possibilidades de encontrar um amor de verdade;
* saúde própria e dos que te cercam sob controle;
* independencia financeira.
Tudo isso somado ao fato de você ser a imagem do que sempre imaginou na sua infância, naqueles sonhos e discussões acoloradas do que você seria quando crescesse estar sendo consolidada com muito trabalho, sendo elogioado pela sua competência (claro, com cuidado ao receber os elogios), e com uma remuneração razoável dentro do mercado.
E derepente você se vê imaginando que não tem motivos para tanta alegria, e ja fica imaginando formas de se punir, nao criando situações de autosabotagem, se olhando no espelho e se achando gordo/magro, feio, alto/baixo, malhado/flacido, tudo isso demais, criando disformias da propria imagem, achando-se sempre longe dos ideias de beleza photoshop vendidos em todas as revistas da atualidade.
Você só consegue ver quem ganha mais, namora mais, viaja mais, consome mais, diverte-se mais, acha-se o últimos dos seres a ter direito a ser feliz como é, porque não é perfeito como o galã da novela das oito.
Cria armadilhas para culpar o motivo de não encontrar um amor, porque você quer a pessoa perfeita, do tamanho exato do seu sonho e nada menos que isso. Você deseja a perfeição no outro que não enxerga em si mesmo.
E então você entra numa crise de perfeição, pois você é exatamente o que sempre desejou, mas culpa-se pelo seu sucesso pessoal, profissional, pelas alegrias que teve, e pelas lágrimas que derramou, pelas rugas que começam a aparecer no canto do olho que declara os acontecimentos da sua vida.
Essa crise é quase uma condição católica-apostólica-cristã-latina que ve na alegria um motivo para autoflagelar-se, imaginando que na próxima esquina uma desgraça o espera para acabar com a sua felicidade. Talvez os povos protestantes ou budistas sejam mais felizes que nós, pois aceitam as condições que lhe são apresentadas de forma muito melhor, em que o sucesso é o resultado do seu trabalho com estar no lugar certo e não como uma forma de te castigar, e provar que você não merece nada do que tem.
Fico imaginando porque não podemos ser simplesmente felizes, e aproveitar os momentos de sucesso e conquista, e porque às vezes alguém vem, como quem não quer nada, dizer que tudo que você tem e faz nada mais é do que um signo da sua ostentação infantil.
Vejo tantas pessoas cobrando a perfeição que nunca terão, e descartando qualquer signo de felicidade, pelo simples fato de não se considerarem merecedoras da alegria plena.
Não vejo motivos para isso. Só eu sei os caminhos que percorri para atingir essa felicidade, as dificuldades que passei para ser o que eu sou e o quanto me custa não ser perfeito, e em tentar ser feliz sem cobranças. Mas claro, ainda tenho uma ponta de culpa, que me diz que eu não mereço nada disso, mas logo olho em volta e sei que mereço sim, pois a felicidade é o nectar dos deuses e a absolvição humana!

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Crise de Catarse

E então anos mais tarde eles se encontraram num bar para beber, conversar e colocar o papo em dia. Ja fazia muito tempo desde o último encontro e muitas coisas tinham acontecido e mudado na vida daquelas pessoas ali reunidas. Tinham casado, separado, recasado, tiveram filhos, se deram bem num trabalho e se deram mal em tantos outros.

Foram anos bons e mas também anos duros os que se passaram, em caminhos tão diversos que nunca se imaginaria tão eclético grupo junto, com uma história comum, com um passado juntos. Foram os melhores amigos, e por ter acontecido durante a sua adolescência, foram cruéis um com o outro. Usaram apelidos, provocaram brigas entre si e se defenderam de outros. Fizeram as pazes, e seguiram caminhos que a vida lhes proporcionaram. Viajaram, conheceram o mundo, ficaram aqui e viveram suas condições.

Da mesma forma que perderam a intimidade do tempo, tem a intimidade da amizade que nuca fora perdida mas que esteve sob o estado de hibernação profunda, que é despertada a cada encontro, com um sorriso, um abraço apertado e sem barreiras, com uma cerveja na mão, e o brilho sincero de estar em boa companhia.

Eis que tanto tempo depois, com a maturidade na alma e o coração limpo, se desculparam pelas ofensas cometidas, pelas gafes, pela distância. Fizeram a Catarse de seus passados, e se prepararam para o futuro, e assim podem seguir suas vidas com um fardo a menos para carregar.

E então conseguiram tornar aquela amizade em indestrutível.

Obrigado aos que estiveram lá.