sábado, 8 de agosto de 2009

crise do ninho

Nos próximos dias estou de mudança. Saio da casa dos meus pais e aos 31 anos irei morar sozinho. Não é uma decisão fácil. Não é um momento tranqüilo.

Essa decisão traz, por si só, uma série de mudanças práticas na vida. A partir de agora eu preciso comprar e fazer a minha comida. Pagar a luz, telefone, TV à cabo, a faxineira, o conserto eventual de um equipamento. Preciso arrumar a cama, limpar o banheiro. Preciso crescer e tomar conta da minha vida por mim mesmo, saindo da barra da saia da minha mãe e das calças do meu pai.
Além das mudanças práticas, há a mudança emocional. Não terei mais com quem conversar ao chegar em casa, pelo menos até arrumar um amor para chamar de meu, ninguém para implicar com meus sapatos espalhados pelo meu quarto ou banheiro. Ninguém estará preocupado se vou para jantar ou a que horas cheguei em casa. Ninguém para brigar ou fazer as pazes. Ninguém para me dar remédios quando doente, exceto se for grave o suficiente para ir ao hospital ou pedir socorro.

Morar nas casas dos meus pais é confortável demais. Não me preocupo com nada, apesar do meu salário, não pago contas, não me preocupo com a manutenção das contas do lar, a roupa é lavada, passada e guardada sem eu tomar conhecimento. Há sempre o que gosto de comer na geladeira ou dispensa. Sempre um chá quente nos momentos de crise. Não terei mais isso.

Por outro lado, morar sozinho me proporcionará liberdade de acertar e errar por mim mesmo, a começar pela decoração, compra de eletrodomésticos, as compras básicas, a pesquisa de preços das compras do mês. Proporcionará-me a experiência de tomar conta da minha vida, para então poder tomar conta de um departamento, de gerenciar pessoas, desenvolver novos talentos, sair da zona de conforto.

Claro, sou o primeiro da família toda a fazer isso. Os demais seguiram o padrão familiar, nascer, crescer, casar, reproduzir, eventualmente separar, casar de novo, reproduzir, e morrer. Não nasci para isso. A partir do momento que mudamos de Estado e Cidade, rompi de vez os laços do tradicional. Nasci, cresci e rompi com o tradicional. Estudei, me formei, escrevi um livro, me pós-graduei, trabalhei, viajei, amei, rompi, me relacionei, terminaram comigo, trabalhei demais, conheci pessoas interessantes, estive no meio da história, na geração cara pintada, fui a shows, vi arte, cultura, moda, ouvi músicas que os pares não fizeram. Não sou melhor nem pior, mas diferente.

As minhas experiências pessoais e culturais me tiraram do trilho da tradicionalidade. Romper com isso não é fácil, pelo contrário é doloroso, como é doloroso ser diferente em tudo, seja na religião, “opção” sexual, profissão, cor, e demais aspectos que podem nos tornar único. Vivemos um mundo de massificação cultural e ser diferente é dolorido, mas não menos normal que os “tradicionais”.

Gosto da diferença, de ser diferente, de tentar, ao menos tentar, pensar por mim, pelas minhas convicções, vontades, desejos e anseios. Vivo e trabalho num mundo corporativo tradicional, de uma carreira padrão, venho de família classe média de comercial de margarina: mãe dona-de-casa, pai provedor, irmã casa e professora e eu advogado. Não desmereço o padrão, pelo contrário, adoro tudo isso, e trabalho para manter o padrão social financeiro, mas não me peça para acompanhar o que todos assistem, e fazer o que os demais fazem, simplesmente não posso.
Eventualmente freqüento os lugares da moda, me visto com roupas da moda, etc., mas não só porque está na moda, mas porque é lá que eu encontrarei meus amigos, e com aquela roupa que me identificarei com meus iguais nas diferenças, na minha turma. Mesmo os diferentes são iguais em alguma coisa.

Sair do ninho aos 31 anos não é fácil, como não o é aos 18, aos 21 ou aos 40, mas em algum momento, será necessário. Dizem alguns sociólogos que os 30 de hoje são os 20 do passado, que é aqui que termina a adolescência, que os filhos saem do ninho de segurança da família, seja casando, seja mudando, viajando, etc., mas aos 30 fazemos o que nossos pais fizeram aos 20. É doloroso e desconfortável, mas é necessário.

Acredito que o fato de perder o contado diário com meus pais melhorará significativamente a qualidade do nosso relacionamento, que considero bom, mas que sem o desgaste diário transformará os momentos de encontro em momentos muito mais especiais. Ambos os lados irão valorizarão imensamente aquele instante de encontro, mas sabe que daqui a pouco um dos lados irá embora para sua casa.

Há neste momento a crise do ninho vazio para meus progenitores, que devem estar morrendo de receio do que poderá acontecer comigo nessa empreitada. Para mim há a crise de deixar o ninho, o medo de não conseguir bater as asas forte o suficiente e não voar, de ter de voltar ao ninho até fortalecer mais os músculos e tentar novamente. Há crises e paixões demais em tudo que envolve esse momento, o que pode causar transtornos que não desejamos, mas que é a forma que temos de demonstrar nosso desespero, medo de tudo dar errado, e com família não modo ou jeito de ser racional, sempre se age passionalmente, intensamente.

É um daqueles momentos que sabemos que nossa vida tomará novo rumo, é uma daquelas encruzilhadas que temos consciência. É o ponto de mudança. Nem sempre temos essa consciência. Mas hoje posso dizer, que a minha decisão de 2 anos atrás de comprar um apartamento, torna essa encruzilhada real hoje. Poderia simplesmente vende-lo e ganhar com a especulação, mas pelo contrário, torno neste momento real a minha decisão.

Estou esticando as asas para levantar vôo do ninho. A altura é elevada, assim como os riscos, o coração dispara, a adrenalina eleva-se. O momento chega. E num segundo, deixo o ninho para viver a minha vida. E tal como todos os empreendedores da humanidade, darei um pequeno passo para a humanidade, mas um enorme passo para um homem.

Que os deuses e anjos me acompanhem, e que o salto seja pacífico. Porque o amor dos meus pais, isso já garante o céu de brigadeiro enquanto estiver voando.

6 comentários:

Anônimo disse...

Só posso dizer uma coisa:
Boa sorte!

E me conta como são as coisas desse lado aí, pra eu ir me preparando...

Anônimo disse...

Sua sensibilidade te faz único Rô.
Meu vôo será para junho de 2010.
Há ansiedade, medo, mas também a conquista de uma estabilidade-instável: é claro que uma coisa não vive sem a outra.
Abração,

Paulo Fco Coelho

Marsano disse...

Taí...gostei do teu texto e sinceridade , parabéns!!!!Sou pai , tenho 47 anos e um filho de 19 anos, mas sei que um dia ele irá viver a vida dele. Obrigado por me ver que isso , um dia acontecerá comigo também.
Fica na paz

Marsano disse...

Taí...gostei do teu texto e sinceridade , parabéns!!!!Sou pai , tenho 47 anos e um filho de 19 anos, mas sei que um dia ele irá viver a vida dele. Obrigado por me ver que isso , um dia acontecerá comigo também.
Fica na paz

Unknown disse...

Pois é a saída do ninho não é fácil, mas uma dica é fazer planejado e sair por um bom motivo, nunca por uma briga ou para fugir de uma situação/mágoa ou algo do tipo... e acho que para os pais, deve ser um dos momentos mais dificeis, em que se tem a concretização que os filhos foram criados para o mundo, e nunca para si.

Angela disse...

Ver um filho sair de casa para voar sozinho,é ao mesmo tempo frustante e a sensação do dever cumprido.Sabemos que o que ensinamos dara a voce estrutura para levar a vida.Além do mais estamos sempre prontos pra receber e dar os abraços que precisares nessa jornada.Amamos e temos imenso orgulho de voce.
Seus pais.