terça-feira, 15 de outubro de 2013

Dia das Crianças - Sem Nostalgia

Agora que o dia das crianças passou e as pessoas voltaram a colocar suas fotos de pessoas crescidas e normais nos perfis das redes sociais, e que as postagens de saudades da infância acabaram, não há mais Topo Gigios, Fofões, e outros brinquedos com mensagens de saudades espalhadas pelos murais alheios, já é possível escrever sobre a infância sem ser massacrado pelos humores alterados pelo excesso de algodão doce que andam consumindo por aí.

Tive uma infância feliz, em Petrópolis, sem luxos, mas sem miséria.... tive bons brinquedos, boas escolas e excelente amigos. Não sofri traumas, não vivi guerras.... não foi um período em que não houve problemas, mas isso não me transformou num serial killer ou maníaco. Sou um cara razoavelmente "normal", dentro do que eu considero normal (o que não bate com a média da população, mas que não será discutido nesse texto), que trabalha e é bom no que faz (aqui é meu blog e não há espaço para falsa modéstia, combinado? Até porque eu faço bem, porque eu gosto do que eu faço), e que leva uma vida de fazer inveja a muita gente: viajo, compro, vou a restaurantes, conheço gente interessante, falo com pessoas importantes, vejo obras bonitas, vou a shows em camarotes, pistas ou área VIP... ou seja, to acima da média.

Minha infância foi muito boa, é verdade. Se há alguma coisa para sentir saudades, não são das brincadeiras de correr, ou dos carrinhos e brinquedos, já diz o ditado que o que muda com a idade do homem é apena o tamanho dos brinquedos, então, eu ainda tenho meus brinquedos, ainda compro Lego, IPADs, e Notebooks, ainda corro por aí, ainda passo tardes jogando conversa fora e rindo a toa com amigos, coisa que eu fazia na infância e adolescência.

Não sinto falta de comer besteiras, quem nunca feriu a dieta aos fim de semana, e depois fez detox, correu para academia? Comer 3 hambúrgueres do McDonald´s e não passar mal não me deixa saudoso da infância. Prefiro comer 1 sanduíche mais bem elaborado, até feito em casa, por mim, mais saboroso, a qualidade superou a quantidade. Não é isso que me traz saudades.

Olhando para aquele tempo não são as tardes livres depois da lição de casa feita, ver a Sessão da Tarde, Super Vick, Malhação, etc., que me deixa triste, embora alguns dias fazer a siesta me deixaria totalmente feliz e disposto o resto do dia, e talvez até um pouco mais produtivo, pois a energia que eu gasto brigando com o sono é hércule, mas as reuniões, compromissos e uma certa "convenção social" não me permitem fazer assim, talvez me reste mudar para Espanha ou Argentina e ser feliz.

No tempo que veio depois da infância e adolescência, aquele que chamamos de "maturidade" o que mais me deixou triste foi perder a inocência de acreditar nas pessoas. É o confiar, mas desconfiando. É ver os acontecimentos diante dos seus olhos e saber que aquilo não é apenas um equívoco da outra pessoa, mas uma estratégia com propósitos claros de derrubar o inimigo. É ver diante de si guerras declaradas entre egos incontroláveis com sede de poder, e você ter consciência disso. É ser obrigado a tomar partido de um ou outro não pela afinidade que você tem com a pessoa, mas pela força da situação e por interesses diferentes. No filme Jobs, na cena que retrata a demissão do Steve da Apple fica muito claro essa situação de tomar partido pela força da situação e por interesse "maior" do que a amizade.

No mundo pós-infância, quando os brinquedos entram nas caixas, o jogo muda muito e nas regras não se encontra espaço para "inocência", você pode ler o manual (se encontrar, é claro), pesquisar, ir a fóruns de pesquisa, perguntar, orar, seja lá que caminho você escolher... não encontrará caminho para aplicar isso na vida adulta. É aqui e agora, onde estou, que tem de tomar partido, de decidir quem vai apoiar e qual postura vai tomar. Não é obrigado e tomar atitudes ilegais ou desleais, é possível manter-se vivo dentro de um critério de honestidade no mundo adulto (apesar de ser Advogado, posso afirmar que isso existe no mundo), mas não é possível sobreviver inocente. Por mais que não participe do jogo de poder, é necessário saber as suas regras, como jogas, acompanhar o campeonato e saber o nome dos jogadores. É preciso saber quem é quem, e qual seu time, nem que seja para ter apenas um chaveiro pendurado na mochila, é necessário tomar partido.

No mundo adulto, mesmo você não sendo jogador, sendo peão no tabuleiro de jogo é importante saber que as peças estão ali com propósitos diferentes, comandadas por alguém que quer derrubar o rei adversário. Não há mais espaço para inocência. Mas não se engane. Não é fácil como no Xadrez em que as peças são pretas ou brancas, aqui elas são em Pantone. 

No fim, o que eu sinto saudades da infância é a facilidade de identificar o bem e o mal. É a inocência da dualidade do mundo, com identificação de uniformes, cores e luzes para o bom e para o ruim. Não sinto falta dos doces e brinquedos, das risadas e do tempo livre. Ganhei tanta coisa com o tempo, tenho mais conhecimento, mais bagagem emocional, mais carimbos no passaporte, mais visão de mundo, maiores limites, mais amores, menos expectativas, mais histórias... mas tenho menos inocência... e é só isso que me faz falta, talvez com uma dose a mais eu pudesse, quem sabe, ver o mundo de forma mais leve.... 

Nenhum comentário: